ÍDOLOS DO BRASILEIRÃO #4: Garrincha, Botafogo.


"É inglês sentado, inglês deitado, inglês ajoelhado. Ingleses fazendo fila indiana diante daquele demônio "de outro planeta" escreve Marcos de Castro na sua obra escrita em parceria com João Máximo "Gigantes do Futebol Brasileiro". Garrincha era de fato um demônio, o gênio das pernas tortas, imparável, incansável.

Manuel Francisco dos Santos nasceu em Pau Grande, minúsculo distrito da minúscula cidade de Magé no Rio de Janeiro. O apelido, Garrincha, deve-se ao fato de ter sido, durante a infância, o maior caçador de passarinhos de Pau Grande, tendo notável preferência pelas Garrinchas, aves minúsculas e desengonçadas, fáceis de caçar. Sua infância resumia-se em ir do mato ao campo de futebol. Ah, o campo onde Garrincha deu seus primeiros dribles.

Aos 14 anos, Mané já era um craque inconfundível e reconhecido em toda Magé e se região, o dono de uma indústria têxtil da região impressionou-se com a bola do garoto e resolveu levá-lo para um período de testes no Vasco da Gama, lá estava o menino, franzino, assustou-se com a quantidade de pessoas presentes no teste, e para piorar, o ingênuo Garrincha não levou sequer chuteiras à São Januário, enfezou-se e foi-se embora. Se era praticamente deus no interior, para que abandonar as regalias da serra carioca?

E não passou de um amador em Pau Grande, até que Arati, ídolo do Botafogo, resolveu subir a serra para vê-lo jogar, impressionado, resolveu levá-lo a um teste no clube da estrela solitária. Teria pela frente um grande adversário, Nílton Santos, um dos maiores laterais-esquerdos do Brasil. Garrincha não quis saber, ignorou a presença de Nílton, driblou e humilhou o já consagrado beque lateral, ao descobrir quem era seu marcador na ocasião, não deu a mínima importância. Nílton Santos foi o primeiro João da vida de Garrincha.

Pelo Botafogo, tornou-se o maior ídolos de um clube lotado de grandes craques nas linhas de sua história, o Santos de Pelé impediu que Garrincha ganhasse mais títulos pelo Fogão, mesmo assim, conquistou dois troféus Roberto Gomes Pedrosa, em 1962 e 64, reconhecidos em 2010 como títulos brasileiros pela CBF. Campeão carioca em 1957, 61 e 61. Pela seleção brasileira, foi peça importante na conquista de 1958, e em 62, carregou o Brasil nas costas, sem Pelé, o demônio se tornou o principal jogador da equipe, assumiu a responsabilidade e trouxe a taça para casa. Ganhou duas Copas para o Brasil.

Foi num Botafogo x Vasco, como de costume, Garrincha destruira o seu marcador, e levara a estrela solitária a mais uma vitória, saía de campo, um repórter atrapalhou sua caminhada até o vestiário e perguntou-lhe: "Garrincha, você sabe o nome do marcador que você desmoralizou esta noite?", "Não, não sei o nome dele, não" respondeu Mané, "É o grande coronel" responde o repórter indignado, "Não quero saber se ele é coronel ou general. Pra mim é tudo João" finalizou o camisa sete e seguiu para o banho. A partir deste dia, quem marcasse Garrincha seria apelidado de João. 

Deixou o Botafogo em 1966, foi para o Corinthians, decepcionou. Decepcionaria em todos os clubes que atuasse até o fim de sua carreira, passou por tantos clubes, tem um currículo quase tão extenso quanto o de Túlio Maravilha. Aposentou-se em 23 de fevereiro de 1972, como atleta do Olaria, a Alegria do Povo, que arrastara multidões ao estádio alguns anos antes chegara ao seu fim, destruído pelo álcool.

Faleceu em 20 de janeiro de 1983, aos 49 anos, no Rio de Janeiro. Na Pau Grande, onde nasceu e se criou, descansa e descansará em paz até o fim dos tempos, em sua lápide, simples e que quase passa despercebida no cemitério onde jaz, o epitáfio colocado por sua família carrega somente seu nome, "Manuel Francisco dos Santos. Garrincha. Aqui jaz a Alegria do Povo".

Segue a homenagem que Carlos Drummond de Andrade prestou a Mané no dia de sua morte: "Se há deus que regula o futebol, esse deus é sobretudo irônico e farsante, e Garrincha foi um de seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos, nos estádios. Mas como é também um deus cruel, tirou do estonteante Garrincha a faculdade de perceber sua condição de agente divino. Foi um pobre e pequeno mortal que ajudou um país inteiro a sublimar suas tristezas. O pior é que as tristezas voltam, e não há outro Garrincha disponível. Precisa-se de um novo, que nos alimente o sonho."

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